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MATERNIDADE NO CÁRCERE

          Em 2015, o caso da detenta Bárbara, que deu à luz na cela de isolamento, teve grande repercussão, levando ao afastamento da diretora do presídio. Bárbara era interna na Penitenciária Talavera Bruce. Paciente psiquiátrica, estava grávida no momento da prisão. Segundo Renata Lira, do MEPCT-RJ, Bárbara fazia acompanhamento em um Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) que não conseguiu entrar em contato com a direção da unidade prisional para atestar sua condição de paciente.

          À época, a direção do Talavera Bruce alegou que ela estaria no isolamento, pois seu convívio com as demais presas era inviável. Em visita ao presídio, Renata Lira relata que o Mecanismo Estadual de Prevenção e Combate à Tortura do Rio de Janeiro solicitou que a presa fosse retirada do isolamento e encaminhada para o Hospital Penal Psiquiátrico Roberto de Medeiros. Tempos depois, saiu na imprensa que Bárbara havia dado à luz sozinha sem qualquer assistência no isolamento e foi levada ao hospital com sua filha ainda ligada ao cordão umbilical. O caso de Bárbara é emblemático, pois reflete o triste quadro vivido pelas mulheres grávidas encarceradas no país.

         As mulheres presas que se encontram gestantes ou que ficam gestantes durante o cumprimento da pena são encaminhadas para o Talavera Bruce, no Complexo Penitenciário de Gericinó, única penitenciária no estado que possui atendimento para as gestantes por dispor de uma Unidade Materno-Infantil (UMI). A UMI é uma instituição com direção independente do Talavera Bruce que recebe as presas logo após o parto e permite o convívio com seus bebês por até seis meses, tempo mínimo garantido em lei. A unidade se diferencia e é referência no país por seu tratamento ao priorizar o cuidado e a manutenção do vínculo afetivo entre mãe e filho nos primeiros meses de vida, ao contrário da realidade da maioria das prisões femininas no país.

       Passado o período máximo em que as mães podem ficar com seus filhos na UMI, em geral um ano, as crianças devem ser entregues aos familiares ou pessoas próximas que possam assumir a responsabilidade pelo bebê. Caso não haja ninguém próximo à presa que possa ficar com a criança, ela é encaminhada para um abrigo e a presa corre risco de perder contato ou de saber a localização do próprio filho.

VIOLÊNCIAS

        Segundo Renata Lira, a alimentação é uma queixa recorrente das gestantes do Talavera Bruce. Não há um cardápio distinto para atender as necessidades nutritivas especiais de mulheres gestantes, a comida é a mesma que a das demais presas. A última refeição do dia é servida às 16h, e a próxima apenas na manhã do dia seguinte, entre 7h e 8h. Questionada pelo MEPCT-RJ sobre o período de jejum imposto às gestantes, a direção argumenta e sugere que as presas podem armazenar o alimento até o horário da próxima refeição.

        Em abril deste ano foi promulgada a Lei n.13.434 que proíbe o uso de algemas durante o parto. A pesquisa “Nascer na prisão: gestação e parto atrás das grades no Brasil” realizada em 2016 pela Fiocruz constatou que o uso de algemas em algum momento da internação para o parto foi realidade para 36% das entrevistadas e 8% relataram terem continuado algemada mesmo durante o trabalho de parto.

         Na contramão do resultado da pesquisa, Renata afirma que o uso de algema não é uma denúncia usual entre as presas no Rio de Janeiro, que desde o ano passado já tinha em vigor uma lei estadual como mesmo propósito da sancionada pelo presidente. Apesar disso, casos de partos realizados na viatura por falta de atendimento emergencial ou violências sofridas pelos agentes ainda fazem parte do cotidiano dessas gestantes.

          Aline Pancieri destaca que durante a realização da pesquisa “Mulheres e crianças encarceradas: um estudo jurídico-social sobre a experiência da maternidade no sistema prisional do Rio de Janeiro” foi possível constatar que a maior parte dos partos são realizados por cesariana, “eu acredito que as mulheres não tinham essa possibilidade de escolha em relação a cesariana e ao parto natural e é um debate que tem que ser feito”, afirma.

          No dia 17 de março desse ano, a justiça concedeu à ex-primeira dama do Rio de Janeiro Adriana Anselmo o direito à prisão domiciliar. A aprovação do Estatuto da Primeira Infância, em março de 2016, alterou o artigo 318 do Código de Processo Penal que determina as condições para a substituição da prisão preventiva pela prisão domiciliar, agora possível para mães com filhos até 12 anos. O caso gerou repercussão e promoveu uma reflexão sobre a situação das demais mães em situação de prisão no país ao compará-las com o direito concedido à ex-primeira dama do Rio e sua condição financeira.

         Antes da alteração, o artigo 318 era válido para mulheres com gravidez avançada (a partir do sétimo mês) ou gravidez de risco. Aline Pancieri, no entanto, conta que conheceu mulheres que se encontravam nessas situações e mesmo assim foram presas. “A prisão domiciliar é um direito da mulher e não deve ser faculdade de um juiz”. Para ela, esse caso pode ser positivo pois abre precedente para que esse entendimento seja utilizado em outros casos, além de trazer uma visibilidade a essa temática da maternidade na prisão. “No final das contas, acho que o saldo é positivo” afirma.

        Segundo a pesquisa “Mulheres e crianças encarceradas: um estudo jurídico-social sobre a experiência da maternidade no sistema prisional do Rio de Janeiro”, realizada com gestantes e parturientes no Talavera Bruce e na UMI em 2015, 73,2% delas são presas provisórias, destas 83,3% aguardam julgamento no Talavera Bruce, e 58,8% na Unidade Materno Infantil.

          Renata Lira fala sobre o caso de Adriana Anselmo e as possíveis consequências para as outras presas.

PRISÃO DOMICILIAR: UM DIREITO DE TODAS?

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